quinta-feira, março 5

De novo?

A imagem, para não dizer linda, era simpaticíssima. Eu caminhava pelo Arpoador, aproveitando minha última semana de ócio no Rio de Janeiro, quando vi, na areia, um garoto de seus 13 anos, solitário, brincando sorridente com sua bola. A cena levou-me de volta à infância, quando, embalado por Romário e Bebeto em sua jornada rumo ao tetra, eu mirava a pelota no ângulo e soltava meu petardo de direita. Se realmente houvesse alguém defendendo a meta, ou mesmo um zagueiro que eu brilhante e imaginariamente driblava, seria um gol de placa.

O garotinho do Arpoador era uma alegria só. No seu Maracanã de areia, seguia ávido em direção às traves de garrafas pet. Ele próprio era o atacante, a torcida e o narrador. O sorriso e o brilho no olhar revelavam o júbilo sonhado por todo brasileiro: o gol no estádio lotado, narrado com empolgação e emoção por uma lenda do jornalismo esportivo. Na comemoração, corria em direção ao mar – neste caso, literal – de torcedores que o exaltavam como ídolo do time do coração.

O saudosismo, via de regra, nos leva a dizer que não existem mais craques, torcidas e tampouco narradores como os de antigamente. Porém, não me enquadro nessa categoria de saudosistas pessimistas, daqueles que não conseguem encontrar beleza em banda nova, carnaval atual ou carro do ano. Acho que o Keirrison tem potencial para ser craque, a torcida do Flamengo anda cada vez mais criativa e a nova safra dos narradores esportivos está muito bem representada por grandes nomes como... er... hum... Luís Roberto, talvez.

“... ele se orgulha de praticar um estilo novo de narração, pontilhada por informações reunidas em horas de pesquisa, e menos baseado na voz potente, como os telespectadores se acostumaram a ouvir desde os “speakers” antediluvianos. Na véspera de cada transmissão, Luís Roberto senta-se em frente ao computador e só sai após acumular um calhamaço de dados sobre times, juízes, jogadores, estádios e competições. O hábito fez dele um arquivo ambulante, que muitas vezes esclarece dúvidas de companheiros no ar, em tempo real.” Do site da ABERT.

Fiquei surpreso quando ontem, durante a transmissão de Flamengo x Ivinhema pela Rede Globo, o excelente narrador e pesquisador supracitado cometeu uma pequena gafe: disse que o timaço que enfrentava o Flamengo (o jogo terminou 5x0 para o rubro-negro) havia disputado o campeonato mato-grossense. Cerca de dez minutos depois, muito provavelmente alertado pelo ponto eletrônico (e, mais provável ainda, pela chuva de e-mails de sul-mato-grossenses exaltados), sutilmente frisou que o Ivinhema era o campeão do Mato Grosso do Sul.

Um pouco desapontado com o episódio e a falta de preparo geográfico do jornalista, pensei: “se eles têm o ponto eletrônico, nós temos o controle remoto”. Apanhei o dito-cujo e fui direto para a Band.

Corinthians x Itumbiara, também pela Copa do Brasil. Senti um certo alívio ao ouvir a voz de um narrador mais experiente e calejado, o famigerado Luciano do Valle. E por falar em experiência, além da possível estréia de Ronaldo pelo Timão, a partida contava ainda, no que tangia à velharia, com mais dois exemplares da velha-guarda brasileira: Túlio Maravilha e Denílson estavam em campo pelo Itumbiara. Pinta a bolinha na tela. Luciano anuncia: “Tem gol! Será que é na Libertadores? Será que é na Copa do Brasil?” Um calor, misturado ao medo, tomou conta do meu corpo, já prevendo mais uma gafe na minha noite de quarta-feira. E não deu outra. “Olha o Flamengo! Fez um a zero no Ivinhema, do Mato Grosso”. Pelo menos não foram necessários dez minutos e nem ponto eletrônico para a correção. Imediatamente, o comentarista e ex-jogador Neto (que não é jornalista), corrigiu o locutor: “Mato Grosso do SUL”.

Confesso que o fato de eu ser nascido no Mato Grosso do Sul foi capital na resolução de escrever este texto, mas a questão aqui é mais que xenófoba, regionalista, bairrista, o que for. A questão é a falta de informação. Ou, por incrível que pareça, o excesso dela.

A disponibilidade de informação e a facilidade de obtê-la tornaram-se tão grandes que, hoje em dia, ninguém mais sabe de cor e salteado os planetas do sistema solar, a tabuada ou as capitais dos estados brasileiros. Por quê? Fácil. É uma conjunção de três fatores que, dependendo do modo como forem utilizados, podem servir para a informação ou a desinformação. São eles: Google, CTRL+C e CTRL+V.

Por saber que, a qualquer hora do dia e da noite, é só mexer no mouse para tirar seu computador do modo “economia de energia”, acessar o Google (isso se já não houver a barra do Google em seu navegador) para se obter a informação que se deseja, as pessoas não têm mais a obrigação de decorar “Mercúrio, Vênus, Terra, Marte, Júpiter, Saturno, Urano, Netuno, Plutão”, como antes. (Eu sou da época em que Plutão ainda era planeta.)

O problema surge quando você não tem tempo de consultar a internet antes de falar, como no caso de Luís Roberto e Luciano do Valle. Ninguém tem a obrigação de saber que o Ivinhema é um time do Mato Grosso do Sul, mas deveriam todos os brasileiros saber que Mato Grosso e Mato Grosso do Sul são dois estados diferentes (já faz 30 anos!) e que não se usa o mesmo adjetivo gentílico para se referir a algo ou alguém de origem de um estado ou do outro.

Morei quase 4 anos em São Paulo, agora moro no Rio. Posso contar nos dedos de uma das mãos quantas vezes ouvi alguém falar Mato Grosso do Sul, ao invés de Mato Grosso. Na verdade, creio que poderia até contar nos dedos da mão esquerda do Lula. A propósito, será que o nosso presidente sabe que Campo Grande fica no Mato Grosso do Sul?

Podem argumentar que o Mato Grosso do Sul deveria ter adotado outro nome, para evitar confusão. Concordo que ajudaria, mas enfatizo que o problema não está só no nome do meu estado, e sim na preguiça – e, às vezes, ignorância - de muitos indivíduos. Só para constar, durante uma narração em setembro de 2005, Luís Roberto informou que “o Internacional ganhou do Rosario Central em Rosario Central”. Vale esclarecer que o nome da cidade argentina é apenas Rosario. Já Luciano do Valle, na mesma partida acima relatada, chamou por mais de uma vez a equipe adversária do Corinthians de Itumbiaria.

Para aqueles que também se indignam com gafes e desrespeitos desse cunho, disponibilizarei um modelo de e-mail a ser enviado quando da ocorrência de mais uma(s) dessa(s) mancada(s) em rede nacional:

“Quando será que os digníssimos e gabaritados profissionais da ________________ (nome da emissora) dar-se-ão conta de que Mato Grosso e Mato Grosso do Sul são estados diferentes desde 1979? Estou profundamente desolado com o crasso erro cometido por __________________ (nome do narrador, comentarista, repórter, etc.) durante o ____________________ (nome do programa ou partida), em ___/___/______ (data).”

Autorizo todo e qualquer cidadão a utilizar o modelo acima. Espero ter auxiliado aos que partilham de minha opinião. Afinal, pra que redigir um e-mail, se podemos usar o CTRL+C e CTRL+V?

10 comentários:

Unknown disse...

hauhauhauha muito bom cabeca!
Eu e o Doda tb estavamos assistindo o jogo e presenciamos essa antiga gafe :-( so fiquei sem entender, que time eh o Misto de Mato Grosso? afe, tantos erros q fiquei confusa ;-p

Anônimo disse...

Puxa vida... mas que coisa horrível! E daí? Que diferença faz? No que isso vai mudar minha vida? Acho que os filhos de MT e MS deveria se preocupar com coisas mais relevantes ao convívio comum e a boa relação entre vizinhos do que com essas babaquices de indignação pela burrice alheia. No que minha vida vai mudar mandando manifestos pra jornalistas tapados que faltaram a aula de geopolítica??? Tenho coisas mais importantes pra gastar meu manifesto.

Fabiano Battaglin disse...

Anônimo, quais seriam as coisas mais importantes com as quais você gastaria seu manifesto? Com uma crítica aos que criticam a desinformação?
Jornalistas são formadores de opinião. A população, principalmente de classe mais baixa - e digo principalmente, pois os indivíduos de todas as classes se enquadram neste perfil -, toma como verdade absoluta o que é dito em uma emissora de televisão como a Globo ou a Bandeirantes.
Creio ser necessário sempre preocuparmo-nos com a qualidade do que vemos na TV, bem como nos jornais e revistas, não apenas no que se refere à geopolítica. Um bom exemplo é a língua portuguesa. É bem capaz que, se uma pessoa não muito culta ouvir um jornalista da Globo utilizando de forma incorreta a concordância verbal, passará a utilizar a mesma forma em seu dia-a-dia. Já imaginou a Fátima Bernardes dizendo "os filhos deveria" em pleno Jornal Nacional?
Educação é fundamental para o desenvolvimento de um país e de seus habitantes. Deveríamos tratar essa questão com mais responsabilidade.
Obrigado pela participação, é com debate que se chega às melhores ideias.

Anônimo disse...

Boo-hoo! It seems Father Christmas forgot about "someone's" present last year.

Thife disse...

Nossa.. eu também posso contar nos dedos as vezes que alguém falou o "do Sul" aqui em São Paulo... rs E sim, realmente irrita. Eu não sou nascido lá, e nunca gostei muito quando morei, mas realmente depois que saímos dói um pouco ouvir errado o nome do "seu" estado.
E eu não tava sabendo que você está no Rio agora! Boa novidade.
Abraços!

;P

Unknown disse...

Meu caro Fabiano.
Sua indignação é mais do que legitima. É dificil aceitar as informações erradas e - talve isso seja mais grave - os erros de portugues dessa gente de televisão.
E não é só no jornalismo, não. As novelas são um escândalo de burrice. Como se fala errado!
De quem escreve (ou fala) para não sei quantos milhões de pessoas deve-se exigir, no mínimo, que saiba falar a lingua de seu país.
Um grande abraço.
Belmiro.
PS: Antes que alguem se atreva a falar do meu portugues, quero lembrar que só escrevo para amigos. Não tenho como prejudicar ninguem.

Anônimo disse...

esse pessoal do Mato Grosso é muito sensível, hahaha :D

Fabiano Battaglin disse...

O pessoal do Mato Grosso, eu não sei.
Mas nós, do Mato Grosso do SUL, somos sensibilíssimos!
Hahahhaa
Bibi, o pessoal lá do Recife, na Paraíba, não é assim?

Anônimo disse...

Meu pai é o MÁMIMO!

Anônimo disse...

MÁXIMO.