quinta-feira, dezembro 7

Adeus, piriformes!

Resultado da ascensão do Império do Silicone, a diáspora dos peitos-pêra se deu por volta do final da década de 2010, começo da de 2020. Exilados estéticos, oprimidos pela ditadura mamária, peregrinavam em fila indiana à procura da terra prometida, onde almejavam encontrar bavários renascentistas que promoveriam a revolução das formas.

A esperança de voltar aos anos áureos, alicerçada pelas teorias cíclicas da moda, era comprimida pelo peso das gordinhas da idade média que não vingaram. Após o grande sucesso nas capas dos pergaminhos de moda da época, jamais figuraram numa Vogue atual. A elas restaram apenas os aplausos de estudantes de história da arte nos Louvres e MASPs da vida.

Sem suporte após a abolição dos soutiens, a comunidade peito-mole-com-orgulho recordava-se do tempo em que a derriére tinha mais valor, quando, mesmo em segundo plano, os piriformes ainda seduziam nas telas das xanxadas brasileiras. Leila Diniz de biquini, a Menina do Lado conquistando o Farião, bons tempos aqueles! Quando um peito era um peito, e não uma bola inflável de aula de pilates.

Outrora tão seguros de si, os refugiados não perceberam a ameaça crescente dos exércitos siliconados, hora marchando em slow motion na areia californiana em maiôs vermelhos; hora ladeados por tatuagens old school na garupa de Harley-Davidsons on the roads of America.

Da do Norte à do Sul, um passo. De Beverly Hills à Oscar Freire, um piscar de olhos. A tão famigerada terra da mulher tupiniquim povoava-se de Pitanguys, que por sua vez exploravam com seus bisturis a matéria-prima mais valiosa da colônia desde o pau-brasil.

Na maior e mais famosa manifestação folclórica do país, as câmeras deixavam de focalizar os traseiros, e só o que se via eram comissões de frente na Sapucaí. Sambiquiras, coxas e sobre-coxas desvalorizadas, o peito alcançava cotações de caviar. Foi apenas uma questão de costume até que as anoréxicas neo-siliconadas não mais tombassem para a frente nas passarelas do São Paulo Fashion Week.

Nem a preferência dos bebês pela borracha do bico da mamadeira à borracha das mamas da mamãe foi capaz de frear a ditadura do peitão.

Hoje, tal cultura dominante encontra-se arraigada na sociedade, que deixou para trás suas raízes e aderiu cegamente à produção do air-bag de série.
No cenário político atual, apesar dos partidos de esquerda intensificarem a militância em favor dos que cabem na mão, as projeções são desanimadoras. De quatro em quatro anos, ocorre a reeleição: as antigas próteses são substituídas por outras do mesmo partido, impedindo-se assim o declínio do Império do Silicone.

Peito caído, nunca mais. Infelizmente, natural tampouco.


*Fabiano Battaglin é publicitário e militante esquerdista, apesar de sua visão peito-política permitir um deslocamento até a extrema direita.